domingo, 30 de agosto de 2009
O centenário de Pio Canedo I
Em meio a este crescente processo de degradação das instituições parlamentares e demonização da atividade política, fez muito bem à alma e ao espírito o encontro de muitos militantes do antigo PSD para render tributo à memória e Pio Canedo, um de seus mais expressivos quadros, cujo centenário se comemorava. Como era natural, não faltaram comentários sobre as acentuadas diferenças entre os políticos daquela geração e aqueles que participam de maneira pouco decorosa desta atividade nos dias de hoje. E sempre me lembro da frase de João Mangabeira, no ensaio sobre Rui Barbosa, quando assinala que “a política é a mais nobre forma de servir à pátria”. De tanto assistir ao triunfo dos incompetentes e ver a ascensão dos moralmente comprometidos, como atualmente, João Mangabeira se vivo fosse modificaria sua célebre definição para acentuar que a política é a forma mais rápida de se locupletar à custa dos cofres públicos.
O centenário de Pio Canedo II
. Faço esta constatação com certa angústia, pois todos sentem desaparecer do panorama humano do poder público do Brasil homens da inteireza moral de Pio Canedo, cuja passagem pela política mineira foi sempre cercada de indesviável linha de comportamento cívico. Quando cheguei à Assembléia no ano de 1959, Pio Canedo, líder natural da bancada do PSD, recebeu-me como companheiro mais novo e inexperiente, cercando-me de todas as atenções como um bom mestre acompanha o aluno. Atuando na política municipal na região de Muriaé, onde os grupos litigantes algumas vezes, ou quase sempre, mantinham-se inflexíveis em suas posições radicalizadas, Pio Canedo sempre conservou a tranqüilidade e a segurança dos homens bem vocacionados. A presença dos varões da Zona da Mata na política de Minas sempre foi assinalada pela incoercível manifestação de pureza de sentimentos e probidade. Luiz Martins Soares, o Zito Soares, a quem Pio Canedo se ligou mais proximamente, Raul Soares, Bernardes e tantos outros que dignificaram a política mineira, escreveram as mais belas páginas de prestação de serviços e exemplos de lisura e comedimento.
O centenário de Pio Canedo III
. Pio Canedo, enquanto viveu, permaneceu fiel a estes princípios e tem a seu crédito tem o notável trabalho de pacificação da política mineira a partir da contra-revolução de 1964, quando o projeto político engendrado pelos militares previa a extinção dos partidos políticos e todo seu cortejo de insuficiências. Eleito vice-governador na chapa de Israel Pinheiro, Pio Canedo trabalhou em harmonia com o deputado udenista Guilherme Machado, consolidando conjunto de regras que deram ensejo à acomodação das correntes desavindas, permitindo a Israel realizar governo rico em realizações. Prudente, fiel à palavra empenhada, de boa formação humanista, Pio Canedo foi um político modelar. Na última segunda-feira, na Capela do Colégio Arnaldo, velhos companheiros do PSD se reuniram em orações pela alma do antigo líder, e não deixaram de elevar preces a Deus para que ilumine os políticos de hoje a seguirem exemplos da atuação pública e privada de Pio Canedo. Um homem e político de admiráveis virtudes.
sábado, 29 de agosto de 2009
Um poema de Ivan Junqueira
Os poetas, mesmo no mundo da fantasia e da emoção, são capazes de premunir e descrever coisas e fatos. Eis o seu poema "O PODER", do qual extraio algumas estrofes:
Eis o poder: seus palácios
hospedam reis e vassalos,
messalinas, pajens, glabros,
eunucos, aias, lacaios,
e até artistas e ratos
.............................................
O poder é assim: devasta,
corrompe, avilta, enxovalha,
do reles pároco ao papa,
e não há um só que escape
ao seu melífluo contágio.
..............................................
O poder é aquele pássaro
que te aguarda sob os galhos.
Tudo ele dá, perdulário.
De tí quer apenas a alma.
Por inteiro. Ou a retalho.
Eis o poder: seus palácios
hospedam reis e vassalos,
messalinas, pajens, glabros,
eunucos, aias, lacaios,
e até artistas e ratos
.............................................
O poder é assim: devasta,
corrompe, avilta, enxovalha,
do reles pároco ao papa,
e não há um só que escape
ao seu melífluo contágio.
..............................................
O poder é aquele pássaro
que te aguarda sob os galhos.
Tudo ele dá, perdulário.
De tí quer apenas a alma.
Por inteiro. Ou a retalho.
segunda-feira, 24 de agosto de 2009
Um poema de Ivan Junqueira
Os poetas são capazes de premunir muitas coisas. Leiam algumas estrofes do poema de Ivan Junqueira "O Poder":
Eis o poder: seus palácios
hospedam reis e vassalos,
messalinas, pajens glabros,
eunucos, aias e lacaios,
e até artistas e ratos.
.......................................................
O poder é assim: devasta,
corrompe, avilta, enxovalha,
do reles pároco ao papa,
e não há um só que escape
ao seu melífluo contágio.
....................................................
Qualquer semelhança com o Brasil de hoje é mera coincidência.
Eis o poder: seus palácios
hospedam reis e vassalos,
messalinas, pajens glabros,
eunucos, aias e lacaios,
e até artistas e ratos.
.......................................................
O poder é assim: devasta,
corrompe, avilta, enxovalha,
do reles pároco ao papa,
e não há um só que escape
ao seu melífluo contágio.
....................................................
Qualquer semelhança com o Brasil de hoje é mera coincidência.
domingo, 16 de agosto de 2009
Cidades intimidadas e amedrontadas I
Nas manchetes dos jornais não há mais espaço para outras notícias. Tudo se resume, diariamente, aos mesmos fatos: assalto, violência, assassinatos, gripe suína, crise no Senado, corrupção. Os bandidos estão fazendo as cidades e sua população de reféns. Impõem a seu talante o que as pessoas devem ou não devem fazer. Somente podem sair a determinadas horas do dia, só podem andar com os vidros de seus carros fechados, para evitar que um pivete atravesse a jugular do motorista com uma navalha ou caco de vidro cortante. Os pobres aposentados e doentes são vítimas de impiedosos arrastões, praticados por bandos de menores errabundos, no dia em que se aventuram a ir aos bancos para receber os minguados proventos de suas aposentadorias. Os dados apresentados pela própria autoridade policial, no caso a Polícia Militar – cuja disciplina, bravura e disposição de luta não são suficientes para dar-lhe a eficiência desejável no combate ao crime – demonstram o nível de perigo a que estão sujeitos os habitantes de Belo Horizonte e de outras cidades
Cidades intimidadas e amedrontadas II
. A Polícia Civil, desaparelhada, apesar das últimas melhorias materiais e funcionais, vivendo aperturas financeiras pela gradativa perda de poder aquisitivo de seus salários, mal armada e desmotivada, vive apenas da tradição de luta de seus homens, cuja boa vontade não compete com a bandidagem municiada com fuzis e metralhadoras de alto poder de fogo. Para tornar ainda mais dramático este quadro de falta de segurança, os bandidos possuem até uma pastoral, enquanto suas vítimas carecem de proteção e amparo do Estado. Textos curtos para opiniões de colaboradores de jornal não comportam estatísticas, mas tornou-se evidente que o número de homicídios no Brasil e em algumas cidades, inclusive mineiras, supera em muito a mortandade em áreas em permanente estado de beligerância pelo radicalismo político e religioso, ceifando vidas ante o olhar leniente da sociedade mundial. Tudo está à vista de todos. Concorrendo para agravar este quadro desalentador, uma legislação criminal antiquada e desajustada às necessidades alcançadas pela modernidade
Cidades intimidadas e amedrontadas III
Piorando ainda mais essa situação, o país está dominado pela pandemia da gripe suína, cujo combate se resume em troca de acusações de desídia e incompetência entre o poder público e a área hospitalar, inculpando-se mutuamente sobre as verdadeiras responsabilidades pelo avanço impiedoso da epidemia. Antes foi a vez da dengue, ainda matando e devastando áreas inteiras, cuja incidência está crescendo no Brasil e em Minas. Enquanto a população fica confinada em suas casas, transformadas em verdadeiros “bunkers” para se proteger dos assaltantes, com estilo de vida imposto pela bandidagem, o governo federal usa da briga senatorial para transformá-la em cortina de fumaça que encobre suas enormes falhas, distraindo a opinião pública com a divulgação da troca de desaforos entre parlamentares enquanto a caravana de malandros oficiais trafega impunemente na construção de suas vantagens e regalias. Vivendo entre cidades intimidadas e amedrontadas, a população dá sinais de cansaço e impaciência.
segunda-feira, 10 de agosto de 2009
O nonagenário Rondon Pacheco I
O Papa João Paulo II, em outubro de 1999, dirigiu Carta aos Anciãos de todo o mundo, documento no qual expande as virtudes da inabalável fé que fez de seu pontificado dos mais frutuosos de todos os tempos. Diz num dos trechos que “cada idade possui a sua beleza e missão. Mas a idade avançada encontra na palavra de Deus grande consideração, a tal ponto que a longevidade é vista como sinal de benevolência divina”. Estou escrevendo estas palavras para comentar os noventa anos de Rondo Pacheco, reverenciado pelo governo de Minas com procedente justiça para exaltar o virtuoso e exemplar homem público. Se o Padre Vidigal fosse ainda vivo e reeditasse seu maravilhoso livro “No Horizonte da Imortalidade”, obra na qual retrata a vida e a obra de ilustres varões acima de 80 anos, nele daria lugar de destaque a Rondon Pacheco, em plena capacidade física e intelectual a esbanjar energias e vitalidade, ensejando a que se retire de sua vida irrepreensíveis exemplos para as novas gerações de políticos que alçam seus primeiros vôos nesta atividade, que João Mangabeira dizia ser “a mais nobre forma de servir à Pátria”.
O nonagenário Rondon Pacheco II
Saber envelhecer é a obra mestra da sensatez e uma das partes mais difíceis da grande arte de viver. Os avanços da genética modificam a cada novo dia o panorama humano do mundo, conquistas que ao eliminarem enfermidades e oferecer condições de vida favoráveis a homens e mulheres, permite-lhes avançar nos anos com segurança e crescente melhoria da qualidade de sua existência. As estatísticas estão aí a fazerem prova provada do crescente aumento das taxas de longevidade. Não se pode nos dias de hoje classificar um homem de noventa anos como velho. Idoso talvez, e mais precisamente será alguém que acabou de ingressar no outono da vida, comparado o biorritmo do homem com os ciclos da natureza a que pertence.
O nonagenário Rondon Pacheco III
. Falando especificamente sobre este nonagenário de Uberlândia, que passou por vários postos na vida pública com austeridade, probidade e recato próprios dos homens vocacionados para a política, sinto-me confortável em prestar este tributo a antigo adversário de meu velho PSD. Tenho grande respeito por ele e pela firmeza das posições que assume. Como governador muito fez. Como chefe da Casa Civil do presidente Costa e Silva cumpriu zelosamente seu dever. É também uma das vítimas da conspiração do silêncio urdida contra todos que apoiaram o contragolpe democrático de 64 contra o assalto ao poder pelos comunistas. Nada o perturba na serenidade do seu aprumo moral e recolhe hoje os louros dos triunfos que iluminaram sua vida. A sociedade moderna ainda não presta reverência e respeito aos cabelos brancos, aos velhos sábios e àqueles de quem Gregório Maranõn dizia serem “às artérias espessas, as que não se deixam sobressaltar ou sobressaltam o sangue que corre por elas, se devem as idéias matrizes do progresso humano”. Assim é a vida. Como dizia Milton Campos, envelhecer não é triste porque é natural.
O nonagenário Rondon Pacheco IV
O mesmo Gregório Marañon faz referência às artérias jovens, responsáveis pelos recordes olímpicos e campeonatos de resistência, modelos semelhantes ao oferecido ao mundo pelo brasileiro César Cielo, recordista mundial dos 50 metros nado livre, prova clássica da natação. Em declarações após o grande feito, o nadador assinalou que ainda não havia atingido a marca ideal, o que somente será possível com esforços inauditos de suas artérias jovens. Umas como outras são merecedoras de ser olhadas com admiração, mas nenhuma delas ganha em relevância e altitude como as artérias dos grandes anciãos que produziram para o mundo o que há de melhor em matéria de pensamento, técnica, e acima de tudo, o culto à liberdade, tesouro conservado pela humanidade contra a fúria dos tiranos.
quinta-feira, 6 de agosto de 2009
Um soneto de Alphonsus de Guimaraens
A cada novo dia mais me deixo envolver pela poesia do bardo de Mariana. Ao ler, você me dará razão:
VISÃO DOS SOLITÁRIOS
Com a vasta escuridão do teu cabelo ensombras,
Se o destranças pelo ar, o próprio sol que bate
Nessa carne que tem a maciez das alfombras
Feitas de seda branca e veludo escarlate
Não seu quem és: atrais e ao mesmo tempo assombras.
Alguma coisa de astro o teu sorriso dá-te...
Errante multidão de espectros e de sombras
Ainda em redor de ti como para um combate.
Para quê, para quê tanta mágoa me deste?
Por que surgiste aqui, na minha noite espessa,
Tu, Rainha imortal de algum Sabá celeste?
Fantasma, és a mulher! Levanta-te, Anjo eterno!
Ergue-te mais, e mais! Como a tua cabeça
Pode tocar o Céu, se tens os pés no inferno?
VISÃO DOS SOLITÁRIOS
Com a vasta escuridão do teu cabelo ensombras,
Se o destranças pelo ar, o próprio sol que bate
Nessa carne que tem a maciez das alfombras
Feitas de seda branca e veludo escarlate
Não seu quem és: atrais e ao mesmo tempo assombras.
Alguma coisa de astro o teu sorriso dá-te...
Errante multidão de espectros e de sombras
Ainda em redor de ti como para um combate.
Para quê, para quê tanta mágoa me deste?
Por que surgiste aqui, na minha noite espessa,
Tu, Rainha imortal de algum Sabá celeste?
Fantasma, és a mulher! Levanta-te, Anjo eterno!
Ergue-te mais, e mais! Como a tua cabeça
Pode tocar o Céu, se tens os pés no inferno?
domingo, 2 de agosto de 2009
CORRUPÇÃO, FEBRE SUINA, CRISE E DOM QUIXOTE
Para cumprir o prazeroso compromisso de produzir uma crônica jornalística todos os sábados, os acontecimentos que observamos diariamente são pouco inspiradores. A qualquer hora do dia, a notícia invariavelmente é a mesma: corrupção, gripe suína, com as quais são gastos preciosos minutos que poderiam ser empregados em coisas mais amenas e agradáveis. Maltratada a paciência dos nacionais, prossegue seu espancamento na cansativa descrição das atrapalhadas senatoriais, continuando o martírio com a interminável e enfadonha descrição do acidente que quase inutiliza o automobilista Felipe Massa. Para fugir ao tédio que tudo isto provoca, tenho por hábito incursionar diariamente nas obras completas de Machado de Assis, maneira prática de fugir das inevitáveis conclusões a que nos conduz esta paralisia que acomete os meios de comunicação do Brasil. Fora desta mesmice, apenas a obsessiva publicidade oficial na construção fantasiosa de um narcisismo doentio e inconseqüente, única maneira encontrada pelo oficialismo para obnubilar um pouco os efeitos que a crise, o desgoverno e as atrapalhadas governamentais causam na opinião pública e arranham a imagem do Brasil. Num dos volumes de crônicas do mais famoso e exuberante escritor brasileiro encontrei um folhetim datado de 24 de outubro de 1864. Provocou em mim profunda descrença com relação às coisas de nosso país. Diz Machado: “É uma santa coisa a democracia – não a democracia que faz viver os espertos, a democracia do papel e da palavra, - mas a democracia praticada honestamente, regularmente. Quando ela deixa de ser sentimento para ser simplesmente forma, quando deixa de ser idéia para ser simplesmente feitio, nunca será democracia, - será espertocracia, que é sempre o governo de todos os feitios e de todas as formas. A democracia sinceramente praticada, - tem os seus Gracos e os seus Franklins; quando degenera em outra coisa tem os seus Quixotes e os seus Panças, Quixotes no sentido da bravata, Panças no sentido do grotesco. Arreia-se a mula de um e o rocinante de outro. Cinco palmos de seda, meia dúzia de vivas, uma fila de tambores, - é quanto basta então para levar o povo atrás de um fanfarrão ao ataque de um moinho ou à defesa de uma donzela”. Foram palavras admiráveis como estas que levaram a escritora irlandesa Edna O’Brien a confessar na televisão sua paixão pelo escritor, desde o primeiro livro dele que teve oportunidade de ler. Projetadas para os dias de hoje, parecem ter sido escritas ontem, sobretudo quando é possível aplicar o neologismo espertocracia ao regime atual, igualmente deturpado pelos feitios e pelas formas, no ventre do qual medra o golpe, o crime organizado, o acesso ao pódio dos mais capazes de produzir o rombo mais brilhante e rendoso, premiados sempre com a larga impunidade. Ruflam os tambores da publicidade alimentando o narcisismo, metros de seda enfeitam os palanques eleitorais para ensejar às claques amestradas os vivas que alimentam a popularidade dos governantes, enquanto segue a procissão do povo inculto aclamando os Quixotes e os Panças do dia. O que mais impressiona nas palavras do grande escritor brasileiro e fundador da Academia Brasileira de Letras e seu primeiro presidente é a desagradável sensação de que o país, a nação, seus políticos e seu povo, não amadureceram, cometendo os mesmos erros, praticando os mesmos desatinos, escolhendo delegados despossuídos de melhor titulação para representá-los. Avançam os anos e a cada nova garimpagem pela história vamos encontrar exemplos de atitudes insensatas praticadas há séculos e reapresentadas agora com níveis de sofisticação e aperfeiçoamento em suas formas delituosas. Tudo muito triste e desalentador na constatação de que esses maus exemplos de comportamento espalham-se pelo país afora e irão contaminar a mocidade, que, mais que nunca, precisa de modelos de dignidade e patriotismo em que se espelhar.
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