segunda-feira, 26 de abril de 2010

Esqueceram Getúlio Vargas I

Minha geração estudantil incorporou à sua memória a lembrança do dia 19 de abril dos idos de 1941/42/43, quando desfilava garbosa e altiva pelas avenidas da capital para homenagear o chefe do Estado Novo, cujo endeusamento era prática habitual no regime instalado a partir de 1937. Chegando ao governo com o apoio das forças mineiras, escolhido chefe do governo provisório em 1930, foi eleito pelo Congresso para o período presidencial que tinha início em 1934 para, em 1937, golpear as instituições sob o fundamento do avanço comunista no Brasil. Estou me lembrando de Getúlio Vargas por uma série de razões, especialmente pela circunstância de que no amplo noticiário desta semana, concentrado nas homenagens pelo cinqüentenário de Brasília e pelo primeiro quartel da morte de Tancredo, esqueceram de comentar que em abril também existia o dia 19, data do nascimento da mais importante figura histórica brasileira do século XX.

Esqueceram Getúlio Dorneles Vargas II

Como o dramático suicídio de Vargas ocorreu em agosto de 1954, já esmaecido pelo tempo e pela incrível capacidade da desmemoria nacional, no vasto painel dos fatos históricos apresentados pelo mês de abril, tal e qual o mês de agosto notável pelos infaustos acontecimentos que ensombraram a vida brasileira, pode ter ocorrido lapso aos comunicadores ao olvidarem da data de nascimento de Vargas. Outro dirão que é preferível saudá-lo pela lei que criou a Petrobras. Outros se lembrarão de que foi de sua lavra a mais moderna legislação social daquele tempo, conquista que nem mesmo os mais ardentes inimigos de Vargas conseguem negar-lhe. Talvez a grande maioria prefira recordar o caudilho gaúcho no dia 24 de agosto, data em que segundo suas próprias palavras “deixava a vida para entrar na história”, gesto cuja dramaticidade tocou intensamente a alma nacional, a ponto de inverter tendência política que aparentava perdas para o suicida.

Esqueceram Getúlio Dorneles Vargas III

Talvez muitos tenham esquecido nas homenagens a Tancredo Neves que o mineiro foi ministro da Justiça do governo Vargas e que o assistiu nos últimos momentos daquele dia de agosto, episódio do qual certamente retirou exemplos de dignidade que lhe serviram como azimute durante o resto de sua via. Enfim, a ampla personalidade de Vargas como homem ou como político, presta-se a inumeráveis especulações para que não fique esquecido seu nascimento, nos tem pos do fastígio do poder comemorado com fogos e clarinadas, hoje sequer lembrado pela natural imposição da natureza das coisas, que dão preferência ao culto de Tiradentes, marco histórico que baliza outros acontecimentos incorporados à memória nacional. Seja como for, o cronista vive de analisar fatos e deles tirar alguma conseqüência. É possível que muitos leitores ainda conservem vivas idiosincrasias herdadas do período Vargas. Mas ninguém negará a ele o lugar de honra que tem na história do Brasil

Esqueceram Getúlio Dorneles Vargas IV

Os episódios políticos que antecederam o retorno de Vargas em 1950 pela via eleitoral são carregados de simbolismo com relação ao destino do líder gaúcho. Em entrevista ao jornal “A Noite” e a uma pergunta mais ousada do repórter que o entrevistou, Vargas manifestou seu receio de ser vítima de enfrentamento pelo desencadear desordenado de forças a ele contrárias com essas palavras: “Ninguém me verá sair do governo desonrado”, sem contudo desmentir a afirmação que deu ao jornalista Samuel Wainer à pergunta se gostaria de voltar ao poder com essas palavras: “se o povo pedir a minha volta eu voltarei. Não com o líder político, mas como líder de massas”. Assim aconteceram as preliminares do retorno de Getúlio ao poder em 1950, pela força do voto popular, destroçando o poderoso esquema adverso armado à sombra do governo Dutra e que afogou na enchente das urnas getulistas o surrado esquema udenista de lançamento da candidatura do Brigadeiro.

domingo, 11 de abril de 2010

A profanação do túmulo de Tancredo I

Candidatos que obedecem cegamente as instruções de marqueteiros estão sujeitos a vexame, em tudo semelhante ao protagonizado pela candidata presidencial na cidade de São João Del Rey. Exalando o odor nauseabundo de descomunal farsa, ante o olhar constrangido do bom Patrus, a candidata depositou flores na sepultura de Tancredo Neves, tentativa burlesca de reconciliação do petismo com o ex-presidente após 25 anos de havê-lo repudiado com radical e não menor agressividade. Se em Ouro Preto depositar flores no Panteon da Inconfidência poderia ser encarado normalmente como peça publicitária de campanha, tentativa que também adquire ares de mistificação aceita com naturalidade pelos ouropretanos acostumados a essas encenações, a visita incorporada do PT ao jazigo do líder mineiro aconteceu com atraso de um quartel de século, após expulsar de seus quadros dos três parlamentares paulistas que votaram em Tancredo no colégio eleitoral, além de recusar publicamente a participação no projeto de união nacional comandado pelo mineiro morto antes de assumir a presidência.

A profanação do túmulo de Tancredo II

Os responsáveis pela publicidade da candidata cometeram grotesco escorregão histórico, como se fosse possível ser levada a sério uma ação que adquiriu insólita expressão de reles e tosca exploração eleitoral de um sentimento que é caro e nobre aos mineiros. Por certo, há de pagar preço alto pela imprudência e impudência políticas no momento próprio, pois mesmo recebendo o perdão, com o é da índole mineira, para o gesto anterior de repulsa aos acenos pacificadores e patrióticos de Tancredo, os nascidos nestas terras das Gerais não se esquecem facilmente do quanto repercutiu negativamente os gestos de hostilidades de Lula e seus companheiros a todas as propostas conciliatórias, feitos em nome de uma união nacional que conseguiu criar condições para consolidação do processo democrático, de que mais tarde se beneficiariam

A profanação do túmulo de Tancredo III

. Os olhos já enfastiados de velho combatente político jamais contemplaram cena tão canhestra e até mesmo provocadora para os brios desta gente valorosa que mora entre estas montanhas, que, como diz o presidente Itamar Franco, “ninguém nivela”. A infeliz proposta marqueteira, inventada para ajudar a melhorar a situação da candidata em Minas Gerais, serviu tão somente para ressuscitar velhas amarguras que jaziam nas sombras do esquecimento e desnudou por completo as fragilidades da candidata em seu propósito de angariar apoios dos mineiros. É bom não esquecer que o então candidato Lula recusou e combateu todas as propostas de união nacional iniciadas pelo presidente Itamar Franco, tendo comandado a expulsão da deputada Luiz Erundina por haver aceitado participar do ministério de união nacional do grande mineiro.

A profanação do túmulo de Tancredo IV

Enfim, o petismo ao qual a candidata se integrou recentemente para efeitos eleitorais, não resgatou seu débito histórico com Minas e muito menos com Tancredo Neves, cuja sepultura sofreu abalos pelo peso da insinceridade e da farsa depositadas sobre ela. A profanação lembrou Joaquim Silvério dos Reis, agravada por um sem número de estroinices ditas depois pela candidata bonifrate.Há na crônica política de Minas um anátema de autoria do famoso José Maria Alkmim: “política não foi feita para calça curta”, querendo significar que o exercício desta nobre atividade exige, a um só tempo, senso de proporções, discrição, equilíbrio nas palavras, enfim, qualidades que os neófitos e improvisados não demonstram em suas arrancadas iniciais. Só o tempo e o exercício continuado dessas virtudes é que capacitará o agente político de um mínimo de condições para seu exercício. A visita da candidata ao túmulo de Tancredo, portando largo sorriso treinado pelos marqueteiros para substituir a carranca fechada da portadora, causou danos irreparáveis que serão cobrados no tempo certo.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Os fundamentos morais da República I

Discursando à beira do túmulo do presidente Floriano Peixoto, o governador do Pará, Lauro Sodré, proferiu palavras candentes que parecem ainda repercutir intensamente: “A República não pode ser isso que aí está, uma casa de negócios dessas em que há tarifas para as consciências”. A repetição de ações marcadas pelo espírito mais antirepublicano assumidas pelo governo federal, comboiando em forte contradição aos postulados legais uma candidatura marcada pela mais ilógica das artes da política, restaura em sua dramaticidade a advertência do político paraense. Em verdade, só a virtude é fundamento da República, aquela virtu de que falava Santo Agostinho como base para construção dos fundamentos de sua filosofia. O que assistimos no Brasil é à mais violenta contrafação a todos os fundamentos do verdadeiro espírito republicano.

Os fundamentos morais da República II

Quando o presidente se desveste dos trajes talares que exornam a suprema autoridade do país, para transformar-se em cabo eleitoral de uma candidata ou candidatos de seu partido, está praticando a mais desrespeitosa afronta aos princípios que informam uma República decente e verdadeiramente democrática. É que o mau exemplo do principal dirigente acaba por se transformar em biombo que oculta toda espécie de desregramento contaminador da moralidade e dos bons princípios éticos. Fácil aos áulicos e correligionários é retirar de sua conduta heterodoxa modelos de comportamento bem distantes dos bons costumes que informam a verdadeira atividade pública e política. Atrás deles seguem pressurosos prefeitos, cabos eleitorais, sindicalistas aparelhados, em fim toda uma coorte de aproveitadores estimulados pela impunidade presidencial à prática dos atos mais condenáveis numa verdadeira democracia.

Os fundamentos morais da República III

. Triste e lamentável foi o ar de deboche com que o presidente recebeu a notícia de que o TSE lhe havia aplicado a multa irrisória de R$5.000 por comportamento ilegal de campanha a destempo do permitido em lei, merecendo multa recorrente superior, mesmo sabendo que o indigitado transgressor é devedor ao citado tribunal de multa de R$900 mil, aplicada em 2002 por campanha igualmente ilegal. Esses episódios tisnam irremediavelmente esse período da história republicana. Nunca tantos se desmandaram. Nunca tantos tentaram estuprar as leis e os bons costumes. Jamais houve tantas agressões ao bom senso. Não há exemplos históricos em que se fez mais tábula rasa dos princípios morais. Não se tem notícia nos anais políticos de homens de governo usando de palavreado chulo e desbocado. Nunca as páginas dos processos criminais se emprenharam em abundância de nomes de tantos atores políticos. A virtude nas democracias republicanas permite ao povo a chance de modificar as coisas. Em, sua simplicidade, aliada à modéstia e muitas vezes à pobreza invencível em que se encontra, o povo costuma realizar verdadeiros milagres.

Os fundamentos morais da República IV

Estão lançadas as bases da campanha política que teve início ilegal pela imprudência e destempero do presidente da República, açodado em lançar uma candidata goela abaixo de seu partido, que engoliu a violência sem mugir nem tugir. Com o início do contraditório eleitoral na televisão, a verdade deverá aparecer luminosa para permitir ao povo uma avaliação correta de tudo o que se passa no país, bombardeado diariamente por custosa publicidade que pretende fazer do branco preto e do quadrado redondo. Quem sabe, Deus acudirá o Brasil nas eleições de outubro, ensejando uma transformação que recomponha as forças morais da nação, restaure os princípios da moralidade, da transparência e da responsabilidade, reponha a verdade em toda sua pureza e permita ao povo um clima de segurança institucional digna das melhores tradições brasileiras. Assim seja, amén.