domingo, 3 de janeiro de 2010

Manoel Rabicó e a Missa do Galo II

Andava sem rumo, com uma manta surrada lançada sobre o ombro direito, uma espécie de manto a dar àquele pobre doido certo toque de realeza. Afinal, não são os mantos, as coroas e os cetros que fazem dos homens reis? Rabicó assumia atitudes estranhas quando das festividades tradicionais da cidade. De onde proviera sua loucura? Era entendida por alguns como conseqüência da pobreza e da miséria em muitos lares daquele interior perdido, onde a fome e a bebida causam tantos males, inclusive a demência. A cidade acostumara-se com Rabicó e ele a percorria como se estivesse em busca do infinito, sem direção e sem objetivo. Ninguém atinou com as razões pelas quais ele sempre se detinha em posição contemplativa à porta das inúmeras igrejas. Cessava seu palavreado confuso e destrambelhado, punha-se silencioso com seu olhar vago e indefinido para os ícones mais destacados dos altares. Não era perturbado neste seu curto solilóquio. Continuava sua peregrinação errante pelas ruas. Na véspera do Natal, Rabicó ficava ainda mais enigmático em sua perturbação mental. Quando os moradores se movimentavam para a Missa do Galo, dele não se tinha notícia.

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